Alberto Teixeira
30 Julho 2022
Espanha avançou com uma taxa sobre os proveitos caídos do céu da banca e energia. Por cá, os lucros dos bancos aumentaram para 1.000 milhões no primeiro semestre. Banqueiros declinam novo imposto.
Os principais bancos em Portugal lucraram 1.002 milhões de euros na primeira metade do ano, o que representa uma subida de 75% em relação ao ano passado. Mas os banqueiros não consideram que os resultados sejam “expressivos”, rejeitam a ideia de os lucros estarem a cair do céu e alertam que ainda há muito caminho a percorrer até serem rentáveis. Nem querem ouvir falar de um imposto extraordinário como aquele que Espanha acabou de anunciar sobre o setor.
O tema dos “lucros caídos do céu” está a aquecer no país vizinho, depois de o governo ter avançado um imposto extraordinário sobre as receitas dos bancos com juros e comissões. A medida visa ainda o setor energético.
Esta sexta-feira, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa não descartou a possibilidade de termos também uma taxa sobre os lucros excessivos em Portugal.
Esse é um caminho que os banqueiros portugueses já disseram que não gostariam de ver por cá. Por várias razões. Uma é que os bancos já pagam muitos impostos, entre contribuições para os fundos de resolução e adicional de solidariedade que foi introduzido na pandemia e ainda não caiu. A outra é que a rentabilidade do negócio continua muito aquém do custo de capital.
Ainda assim, os bancos nacionais viram os seus resultados melhorarem significativamente nos seis primeiros meses do ano. O lucro do BCP disparou 500% e o do Santander Totta subiu 200%. Já esta sexta foi a vez de o BPI anunciar um aumento de 9% do lucro e a Caixa revelar que os resultados subiram 65%. O Novobanco apresenta as contas na segunda.
Cada banco enfrenta a sua realidade. No BCP e Totta, por exemplo, o disparo dos resultados deve ser entendido à luz da reestruturação que fizeram em 2021 e cujos custos extraordinários foram contabilizados no exercício semestral do ano passado. Razão pela qual, livres agora desses encargos, assistiram a uma subida acentuada dos lucros.
No que diz respeito ao BPI, metade do resultado de 214 milhões veio de Angola. Na Caixa, uma grande parte do lucro de 486 milhões veio de recuperação de crédito e de provisões, ou seja, de perdas que registou no passado.
Ter lucro não é sinónimo de rentabilidade, argumentam os banqueiros. Esses indicadores parecem dar-lhes razão. No BCP, a rentabilidade dos capitais próprios (ROE) está nos 2,8%, depois de ter obtido um lucro de 74,5 milhões, o mais baixo dos grandes bancos. O BPI e o Totta contam com um return on tangible equity (ROTE) de 6,4% e 10,5%. A Caixa tem o ROE de 10%. Apenas o Totta e o banco público apresentam rentabilidades capazes de cobrir o custo de capital, o que deixa os outros bancos a dizerem que ainda “há muito trabalho a fazer” para serem atrativos para os investidores.
O que dizem os banqueiros?
Apesar da melhoria dos resultados na primeira metade do ano, o nível de lucros ainda não satisfaz a banca. “Podem parecer expressivos, mas em termos relativos não são”, disse o líder do BPI, explicando que, além de o ROE não cobrir o custo do capital, os bancos continuam a ter avaliações em bolsa completamente esmagadas em relação ao valor contabilístico (book value).
O BCP, o único banco nacional cotado em bolsa, tem transacionado no mercado com um desconto de 50% em relação ao book value nos últimos anos. O seu CEO, Miguel Maya, também rejeitou liminarmente a ideia de “lucros caídos do céu”. “Estamos com ROE abaixo de 3%, é manifestamente baixo. O que digo é que temos resultados extraordinários por baixo”, argumentou.
“Lucros excessivos? Até agora zero”, disse o presidente da Caixa. Até mostrou um slide com as avaliações que os investidores estão a dar aos bancos espanhóis, alemães e franceses entre os 0,32 e 0,54 vezes o book value. “Que os bancos vão aumentar os resultados, irão, mas o mercado não acredita que os bancos tenham lucros extraordinários, senão isso estaria refletido nas avaliações. É que temos outros riscos: de recessão, de diminuição de rendimento disponível com risco de aumento de malparado”, explicou. Ou seja, “o mercado vê tudo menos uma banca com lucros sorridentes”.
Além da baixa rentabilidade, também lamentam a elevada carga fiscal que pesa sobre a sua atividade – mais elevada do que nos outros países e que “mina a competitividade dos bancos nacionais” no mercado europeu, salientou Miguel Maya. Além de pagarem para o fundo único de resolução europeu, também têm de pagar para o Fundo de Resolução nacional e ainda a contribuição extraordinária sobre o setor bancário, que existe desde 2011, e o adicional de solidariedade criado na pandemia.
Por isso, o CEO do Totta, Castro e Almeida, até ironizou sobre se via o Governo português a acompanhar o espanhol na criação de uma taxa sobre receitas excessivas: “Mais impostos? Só se for retirar. Quando se fala de impostos, se calhar está na altura de os tirar. Em Espanha, eles estão a querer introduzir, em Portugal, não sei se vão retirar o imposto que já existe”.
Já Oliveira e Costa não vê essa taxa espanhola a ser replicada em Portugal e destacou que os bancos portugueses já demonstram uma “solidariedade significativa” com a sociedade, citando os 48,3 milhões de euros de contribuições para os fundos de resolução e adicional de solidariedade.
Comissões e margem de juros sobem mais de 10%
A nova taxa extraordinária em Espanha aplica-se às receitas com comissões e margem financeira dos bancos com faturação acima dos 800 milhões de euros. O Governo espanhol quer travar proveitos “excessivos” com a subida dos juros e o impacto nas famílias e empresas.
Por cá, uma parte da subida dos lucros dos bancos nacionais deve-se exatamente à melhoria da margem de juros e das comissões, que são o core da atividade bancária.
No seu conjunto, os bancos viram a margem financeira, que resulta sobretudo da diferença dos juros cobrados nos empréstimos e os juros pagos nos depósitos, aumentar quase 17% para 2.180 milhões de euros. O comissionamento aumentou quase 13% para 1.078 milhões.
Explicações? Não são receitas a caírem do céu, dizem os banqueiros. A subida deve-se ao aumento dos volumes de crédito concedido à economia e ao maior número de transações (devido à abertura da economia após a pandemia e ainda aos negócios dos seguros e mercados financeiros) e não à subida dos spreads dos empréstimos ou do preçário, argumentam.
O administrador financeiro do Santander Totta, Manuel Preto, lembrou que a subida dos juros ainda vai demorar no repricing dos contratos e que 30% do funding do banco vem dos mercados (e não depósitos), que já estão a cobrar mais por via do aumento dos spreads da dívida pública. Por isso, espera que a pressão na margem continue até final do ano.
Para o BCP, que se destaca no aumento da margem financeira, o desempenho deve-se em grande parte ao banco na Polónia, onde o banco central iniciou o ciclo de subida dos juros mais cedo do que o BCE.
Todos lembram ainda que vivemos um período anormal de juros muito baixos e que ainda não regressamos a níveis normais. E “não será com a Euribor a 2% que há lucros anormais”, atirou Paulo Macedo.