Isabel Patrício
4 Novembro 2021
A proposta aprovada pelo deputados dita que os empregadores têm de se abster de contactar os trabalhadores no período de descanso. A violação desse dever constitui uma contraordenação grave.
Os empregadores vão deixar de poder contactar os trabalhadores fora do horário de trabalho, exceto em “situações de força maior”. Caso não respeitem o período de descanso, estarão a incorrer numa contraordenação grave, arriscando uma coima até 9.690 euros.
Em causa está uma proposta da autoria do PS que foi aprovada, esta quarta-feira, em votações indiciárias — isto é, que ainda carecem de confirmação na Comissão de Trabalho e em plenário da Assembleia da República –, com a abstenção do Bloco de Esquerda, do PCP e do PSD e os votos favoráveis dos socialistas. Nesse diploma, prevê-se que o empregador “tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvando as situações de força maior”. Ou seja, exceto em alguns casos específicos (nomeadamente acidentes ou incêndios), as empresas não podem estabelecer nenhum tipo de contacto com os trabalhadores ao seu serviço fora do horário de trabalho.
Esta alteração ao Código do Trabalho — à qual os deputados deram o nome de “dever de abstenção de contacto” — abrange todos os trabalhadores, quer estejam a exercer as suas funções presencialmente, quer o façam de forma remota. Além disso, a proposta socialista agora aprovada deixa claro que constitui uma contraordenação grave a violação deste dever pelo empregador.
Ora, de acordo com a lei laboral, as contraordenações graves dão lugar a coimas entre seis e 95 unidades de conta, isto é, entre 612 euros e 9.690 euros, valor que varia em função do volume de negócios da empresa e do grau de culpa do infrator.
Assim, no caso das empresas com volume de negócios inferior a 500 mil euros, em situações de negligência, a coima mínima é de 612 euros e a máxima é de 1.224 euros. Já em caso de dolo, a coima mínima é de 1.326 euros e a máxima de 2.652 euros.
Para empresas com volume de negócios igual ou superior a 500 mil euros, mas inferior a 2,5 milhões de euros, a infração por negligência dá azo à aplicação de uma coima entre 714 euros (mínimo) e 1.428 euros (máximo). Em situações de dolo, os limites são, neste caso, 1.530 euros e 4.080 euros.
Já no caso das empresas com volume de negócios igual ou superior a 2,5 milhões de euros, mas inferior a cinco milhões de euros, os limites são os seguintes: entre 1.020 euros e 2.040 euros, para situações de negligência, e entre 2.142 euros e 4.590 euros, em situações de dolo.
Por outro lado, no caso das empresas com volume de negócios igual ou superior a cinco milhões de euros, mas inferior a dez milhões de euros, a coima mínima, em situações de negligência, é de 1.224 euros e a máxima é de 2.550 euros. Em casos de dolo, a penalização varia entre 2.652 euros (mínimo) e 5.100 euros (máximo).
As empresas com maior volume de negócios (igual ou superior a dez milhões de euros) podem esperar coimas mais pesadas: entre 1.530 euros (mínimo) e 4.080 euros (máximo), em situações de negligência, e entre 5.610 euros (mínimo) e 9.690 euros (máximo), em situações de dolo.
Estes valores de penalização também serão aplicados, com as mesmas variações, aos empregadores que não promovam contactos presenciais entre os teletrabalhadores e as chefias e os demais trabalhadores, com a periodicidade estabelecida no acordo de teletrabalho ou, em caso de omissão, “com intervalos não superiores a dois meses“.
Este dever consta também de uma proposta do PS que foi aprovada esta quarta-feira pelos deputados do grupo de trabalho dedicado às iniciativas legislativas referentes ao teletrabalho. O PS e o Bloco de Esquerda votaram favoravelmente, enquanto o PCP absteve-se. O objetivo é reduzir o isolamento dos teletrabalhadores.
É importante explicar que, nas votações indiciárias, foram rejeitadas todas as propostas que estabeleciam o chamado “direito a desligar”, considerando os deputados do PSD, do BE e do PCP que tal já está incluído atualmente na lei laboral.
Além das duas medidas referidas, os deputados aprovaram, em grupo de trabalho, o alargamento do teletrabalho sem acordo do empregador a (alguns) pais com filhos até oito anos e o pagamento obrigatório das despesas implicadas no trabalho à distância, nomeadamente os custos com energia e internet.
Todas as votações terão, contudo, de ser ainda confirmadas numa reunião da Comissão de Trabalho (que deverá acontecer esta quinta-feira). A expectativa é, pois, que a votação final consiga ser feita no plenário desta sexta-feira, estando os deputados numa “corrida contra o tempo”, na medida em que, perante o chumbo da proposta de Orçamento do Estado para 2022, o Chefe de Estado já sinalizou que deverá dissolver a Assembleia da República — o que faria cair todas as iniciativas legislativas em curso — e antecipar as eleições legislativas.
A decisão formal de Marcelo Rebelo de Sousa, bem como a data da próxima ida às urnas, deverá ser anunciada ao país esta quinta-feira, depois de o Presidente da República ter reunido com os parceiros sociais, com os partidos com representação parlamentar e com os conselheiros de Estado.
As mexidas ao Código do Trabalho que vierem a ser confirmadamente aprovadas pelo Parlamento deverão entrar “em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação”, segundo a proposta socialista que recebeu “luz verde”.