Terça-feira, 21 de Janeiro, 2025

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Fotografia: DR

Greve da Caixa Geral de Depósitos no Minho com adesão superior ao resto do país
O MINHO

12/08/2021 às 23:18
Por Tomás Guerreiro

 
 

 – Entrevista a Joana Rodrigues, coordenadora do STEC no Norte –

 

No dia 09 de agosto, em vários municípios do Minho, os balcões da Caixa Geral de Depósitos não abriram ao público. A greve convocada pelo Sindicato dos Trabalhadores e das Empresas da Caixa Geral de Depósitos (STEC) encerrou, conforme noticiou O MINHO, todas as agências do banco público, em Braga, Barcelos, Amares, Terras de Bouro e Póvoa de Lanhoso. Joana Rodrigues, coordenadora do STEC no Norte do país, explica ao jornal as motivações da greve, a adesão no Minho e os termos da negociação laboral entre colaboradores e administração da CGD.

 
Quais as reivindicações do Sindicato dos Trabalhadores e das Empresas da Caixa Geral de Depósitos (STEC)?
 
O Grupo CGD tem vindo a ser desmantelado e a sua imagem tem vindo a ser denegrida ao longo dos últimos tempos. Estratégias e opções erradas na gestão da CGD, por parte dos sucessivos Governos e Administrações, têm vindo a ser encetadas e essa responsabilidade não pode ser dissociada do momento actual que vivemos. Aliás, o processo de reestruturação e recapitalização assinado entre o Governo e Bruxelas a que a CGD foi sujeita entre 2017 e 2020 e que levou a uma diminuição de cerca de 2300 trabalhadores, ao fecho de cerca de 150 agências e uma consequente perda de quota de mercado, foi resultado duma descapitalização do Banco Público decorrente destas mesmas opções e estratégias danosas.
 
A CGD ao longo dos anos tem vindo a distribuir milhões de euros aos Orçamentos de Estado e mesmo em tempos de pandemia só no 1.º semestre de 2021 apresentou 294 milhões de euros de lucros, lucros esses conseguidos com o esforço e dedicação dos trabalhadores que também durante esta pandemia continuaram a prestar um serviço essencial à população, sempre com o profissionalismo, esforço e dedicação que nos é reconhecido pelos clientes que continuam fidelizados à CGD. Por isso as nossas reivindicações passam pela exigência de respeito, reconhecimento e valorização do trabalho, pela defesa da CGD enquanto Banco Público e por condições de trabalho dignas para uma prestação de serviço com qualidade.
 
Lutamos por uma resposta à nossa proposta salarial que valorize os trabalhadores e aposentados da CGD, pela contabilização dos 4 anos entre 2013 e 2016 em que a nossa carreira esteve e está congelada, pelo respeito da contratação coletiva e contra os atropelos ao Acordo de Empresa e ao Código de Trabalho, contra as horas extraordinárias não pagas, contra a desumanização do trabalho e contra a pressão e objetivos irrealistas e inalcançáveis. Lutamos por uma Caixa Forte que é o que o nosso País precisa e não por uma caixinha!
 
Quantos funcionários representa o STEC, no universo da Caixa Geral de Depósitos?
 

A CGD tem mais de 50 % de trabalhadores sindicalizados o que por si só já é uma realidade diferente do resto das empresas em Portugal, sendo que o STEC representa mais de 80 % desses trabalhadores sindicalizados e é sem dúvida o sindicato mais representativo dentro do Grupo CGD. Além disso, há muitos trabalhadores que quando passam à situação de pré-reforma ou reforma continuam sindicalizados, não só pela questão de continuarem vinculados aos colegas do ativo em algumas matérias, tais como a atualização salarial ou acções coletivas que estejam a decorrer a nível jurídico, mas principalmente para dar força, e bem, à estrutura que os representa. Existe um sentimento de pertença colectiva que faz realmente a diferença.

 
 
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Joana Rodrigues. Imagem: RTP
 
Qual a flexibilidade da administração da CGD para negociar com os sindicatos?
 
O STEC ao longo dos seus 20 anos de existência, sempre teve uma postura responsável em defesa da CGD e na luta pelos interesses e direitos dos seus trabalhadores, a par com uma tentativa de diálogo com todas as administrações que passaram pela CGD. Nos últimos tempos as dificuldades no diálogo têm aumentado, em 2018 fomos surpreendidos com uma denúncia do nosso acordo de empresa, o que nunca tinha acontecido e que fez com que tivéssemos que estar durante 2 anos a negociar um Acordo de Empresa praticamente a partir do zero. No que à actualização salarial diz respeito, e após estarmos sem aumentos desde 2010 por via das imposições do Orçamento de Estado, em 2019 tivemos que iniciar um processo de conciliação no Ministério do Trabalho, e só assim conseguimos uma resposta desta Administração para a tabela salarial de 2019 e 2020.
 
Neste momento e, no que ao ano de 2021 diz respeito, apresentámos a nossa proposta de atualização salarial em Janeiro e até agora não tivemos resposta, por isso voltámos ao Ministério do Trabalho e estamos em fase de conciliação onde já decorreram 3 reuniões e até agora, nada. Por isso, podemos dizer que a Administração da CGD não tem tido a postura de reconhecimento e respeito que devia para com os seus trabalhadores e o diálogo é mais uma espécie de monólogo ou diálogo de surdos. Já agora, importa dizer que quer o atual Governo quer os Governos que o antecederam também poderiam ter tido uma intervenção diferente já que têm a tutela da CGD e, entre outras coisas, nomeiam as sucessivas administrações…
 
Quantos funcionários da CGD estão sindicalizados na região do Minho e qual foi a percentagem de adesão na última greve?
 

Na Região Norte temos uma percentagem de sindicalização no STEC superior a 70% na rede comercial, existindo, até, muitos locais de trabalho que fazem o pleno de sindicalização no STEC. À semelhança, aliás, de outros locais de trabalho. A Região do Minho não é excepção da percentagem da Região Norte e sempre existiu uma boa intervenção e dinâmica sindical, com delegados sindicais muito interventivos nos locais de trabalho e isso foi também fundamental para a greve ter tido o impacto que teve. Mesmo com todas as tentativas de desmobilização por parte da CGD e todo o medo que é incutido, a adesão foi superior a 70 % a nível nacional, com centenas de agências encerradas e outras com a porta fechada sem condições para atendimento e na Região do Minho essa percentagem foi claramente superior.
 

No norte do país, especificamente no Minho, a adesão à greve do dia 09 de agosto encerrou todos os balcões da CGD, em Braga, Barcelos, Amares, Terras de Bouro e Póvoa de Lanhoso. Estão previstas mais ações sindicais?
 
Realmente encerraram muitos balcões da CGD, os referidos e muitos outros. Permita-me saudar todos os trabalhadores do Grupo CGD da Região Minho mas também do restante país e ilhas, que no passado dia 09 de agosto mostraram o seu descontentamento e fizeram greve, os trabalhadores da CGD mostraram que estão dispostos a lutar pelos seus direitos. Existem mais do que motivos para os trabalhadores e os reformados estarem em luta, seja pelo reconhecimento, valorização e respeito que é mais do que devido, mas também pela preocupação que temos com a CGD, com o papel que o Banco Público tem que ter na economia nacional.
 
A CGD é, há mais de 145 anos o Banco de referência em Portugal, de apoio às famílias e às PME e, é nesta altura de recuperação económica, com a chegada da “bazuca europeia” que a Caixa tem que ter um papel essencial e central na economia portuguesa. Por isso, esta luta é de todos nós, dos trabalhadores e da população portuguesa na defesa duma CGD pública e forte. E nós, trabalhadores, lutamos também por poder continuar a prestar esse serviço essencial, por ter condições de trabalho dignas. Por isso, enquanto não existir uma alteração de postura por parte desta Administração, enquanto os trabalhadores e reformados da CGD não forem valorizados e respeitados a luta vai continuar!
 
Não só os funcionários da banca pública, como os funcionários da banca privada, têm vindo a manifestar desacordo com as entidades patronais. O que diferencia estes dois modelos empresariais? E, quais as diferenças no vínculo laboral e nas carreiras dos colaboradores?
 
Os trabalhadores da banca estão a passar por momentos complicados. Trata-se de um sector em que a digitalização mais se faz sentir e tende a alterar significativamente o modo de funcionamento, e também tem servido de desculpa para se poder encetar práticas de desumanização do trabalho neste sector. Nos últimos 10 anos os bancos em Portugal, diminuíram em cerca de 16000 trabalhadores os seus quadros de pessoal. Os trabalhadores da banca cada vez têm mais objetivos, mais números, mais pressão e, como cada vez somos menos, existe o medo de cada um de nós ser o próximo a ir embora. Os trabalhadores da banca estão em desacordo com as entidades patronais porque é impossível fazer todo o trabalho que é exigido com o quadro de pessoal e as condições de trabalho existentes, é necessário que as políticas de gestão se coadunem com a realidade.
 
Continuam a ser exigidos aos trabalhadores objetivos inalcançáveis e irreais, o serviço não diminui, antes pelo contrário aumenta, porque em sítios onde éramos 6 agora somos 3 ou menos a fazer a mesma coisa, há cada vez mais pressão para se trabalhar fora de horas para o serviço estar feito e isso são tudo reflexos de políticas de gestão que não se coadunam com a realidade…quem está a gerir esta casa tem que conhecer a realidade, tem que ter em atenção realidades geográficas, o tipo de clientes e as práticas da casa!
 
A CGD é diferente da restante banca por todas estas especificidades e também pelo facto de termos uma responsabilidade social diferente, logo tem que existir essa sensibilidade, atenção e preocupação por parte de quem administra, mas também por parte de quem tem a tutela que é o Governo. Em termos de vínculo laboral existem diferenças, pois na CGD temos colegas com contrato de provimento e colegas com contrato individual de trabalho o que implica que em termos jurídicos as situações tenham que passar pelo Tribunal Administrativo e Tribunal de Trabalho. Também em termos de contrato coletivo de trabalho existem diferenças, pois na CGD temos um acordo de empresa e um acordo coletivo para as empresas do Grupo assinado entre a CGD e o STEC, enquanto a restante banca tem um acordo coletivo de trabalho do sector bancário e ainda alguns acordos de empresa de alguns bancos. Além disso, como empresa do sector empresarial do Estado respondemos directamente ao OE e às suas imposições.
 
Há funcionários que não se reveem nas reivindicações do STEC? Porquê?
 
Não diria que há trabalhadores que não se reveem nas reivindicações do STEC, pelo menos não temos conhecimento que algum trabalhador tenhas recusado as reivindicações alcançadas pelo STEC. Podem existir trabalhadores da CGD não sindicalizados e também poucos trabalhadores sindicalizados noutros sindicatos por opção ou por estarem afectos ao sistema complementar de saúde SAMS, mas acredito que também eles reconhecem que os problemas que temos dizem respeito a todos e as preocupações são transversais a todos também.
 

Sinceramente acho que existe um clima geral de desmotivação, de falta de reconhecimento, de pressão que faz com que os trabalhadores reajam de forma diferente. Existe muito medo dentro da CGD e sabemos que o medo pode gerar várias reações. A política do “dividir para reinar” também surte efeito, mas sinceramente acho que já começa a não surtir tanto. Os trabalhadores começam a perceber que “ninguém passa por entre os pingos da chuva” e que aquele reconhecimento prometido nunca chega e que por isso só juntos é que vamos conseguir fazer a diferença. Esse sentimento de união é imprescindível para ultrapassar esta fase e a verdade é que estamos todos no mesmo barco, independentemente do local onde estamos, do serviço que prestamos ou da categoria que temos, somos todos trabalhadores da CGD, preocupados com os nossos postos de trabalho e com a continuidade da empresa, e os únicos que não são da casa são as sucessivas administrações que vão passando… pois nós ficamos.

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