Sónia M. Lourenço
20-04-2022
Sindicatos estão reunidos com a ministra da Presidência. Insistiram na necessidade de um aumento salarial intercalar, face à escalada dos preços, mas, o Governo não vai além dos 0,9%, aplicados desde janeiro.
O Governo recusa ir além do aumento salarial de 0,9% para a Função Pública este ano, que já está a ser aplicado desde janeiro, argumentando que é preciso “conter a inflação”. Foi esta a mensagem transmitida aos jornalistas por Helena Rodrigues, presidente do STE (afeto à UGT), a primeira estrutura sindical da Administração Pública (AP) a reunir esta quarta-feira com a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, que nesta legislatura tem a tutela dos trabalhadores do Estado.
A reivindicação de um aumento intercalar, face à escalada dos preços a que se assiste no país, agravada pela guerra na Ucrânia, é um dos temas que os sindicatos levam ao encontro com a ministra. As reuniões, que decorrem esta quarta-feira, visam apresentar a nova equipa governativa com a tutela da AP, mas os sindicatos não querem deixar a oportunidade de apresentar as suas exigências negociais ainda para este ano e para a legislatura.
A resposta ouvida, segundo Helena Rodrigues, foi de que “o Governo mantém a atualização de 0,9% e que tem como objetivo conter a inflação”. E frisou: “O Governo vem dizer aos trabalhadores da AP, e por arrastamento aos trabalhadores do sector privado, que contenham a inflação com a perda remuneratória que vão ter, devido a um acréscimo salarial abaixo dos valores da inflação. O que é errado. O que vamos ter é perda real de salários”.
Sebastiâo Santana, coordenador da Frente Comum (afeta à CGTP), confirma: “A ministra disse que o Governo não tem disponibilidade para discutir os 0,9%”.
“Lamentamos esta posição do Governo”, diz por sua vez ao Expresso José Abraão, dirigente da FESAP (afeta à UGT), acusando o Executivo de “culto do défice”. E vinca: “Mais umas décimas permitiriam ao Governo dar um sinal” aos trabalhadores da AP.
Recorde-se que o Governo avançou com os 0,9% de atualização da tabela remuneratória da AP previstos na proposta inicial do Orçamento do Estado para 2022 (OE2022), apesar do chumbo do documento no Parlamento em outubro do ano passado. Esse valor seguiu a regra da anterior legislatura de usar como referencial para os aumentos salariais na Função Pública a inflação média anual do ano anterior.
Contudo, esses 0,9% acabaram por ficar aquém da inflação registada em 2021, que atingiu os 1,3%. E, para este ano, a nova proposta do OE2022, entregue na semana passada, aponta para uma taxa de inflação média anual de 3,7%, medida pelo Índice de Preços no Consumidor (IPC).
Funcionários do Estado perdem 6,2% com António Costa
Contas feitas, os cálculos do Expresso indicam que, considerando o impacto da inflação, os salários da Função Pública vão chegar a 2022 com uma perda no poder de compra de até 6,2% face a 2016, o primeiro ano completo de governação Costa. Cálculos que não consideram a referida reversão de cortes salariais da troika, já que estes eram temporários, nem o efeito das progressões, que varia de trabalhador para trabalhador. Até porque, devido ao sistema de quotas em vigor na avaliação da função pública, a grande maioria dos funcionários (75%) demora dez anos a avançar uma posição remuneratória.
Além disso, se a conta for feita desde 2010 – altura em que se iniciou o congelamento da tabela remuneratória só interrompido, até este ano, em 2020 – a degradação nos salários, em termos reais, chega aos 12,9%.
O Governo não se compromete a manter a regra em vigor na anterior legislatura para os aumentos salariais na Função Pública. Ou seja, a cobrir em 2023 a inflação registada este ano. A aplicar-se esta regra, os cálculos já efetuados pelo Expresso apontam para uma fatura em termos de despesa pública de perto de mil milhões de euros, quatro vezes mais do que os 225 milhões de euros assumidos pelo Executivo com a atualização de 0,9% aplicada em 2022.
A proposta do OE 2022 é omissa sobre este tema. Mais ainda, o ministro das Finanças, Fernando Medina, em entrevista recente à RTP não assumiu o compromisso, questionados pelo Expresso sobre o tema, Ministério das Finanças e Ministério da Presidência (que agora tutela a AP) não respondem, e na reunião desta quarta-feira, a ministra Mariana Vieira da Silva voltou a não se comprometer. “A mensagem que ouvimos foi de que este ano são 0,9% e para o ano negociaremos”, disse ao Expresso Helena Rodrigues.
José Abraão aponta no mesmo sentido: “Quando perguntámos se iríamos ter aumentos de 4% em 2023 se a inflação este ano for de 4%, a resposta da ministra foi vamos ver, há uma grande incerteza. Não disse sim nem não”.
Agora, “vamos continuar a sensibilizar o Governo e o Parlamento” para a questão salarial. Mas, “não descartamos nada em termos de manifestação de descontentamento com esta proposta de orçamento”, remata.
Já Sebastião Santana diz ao Expresso que “vamos reunir já hoje o secretariado da Frente Comum e no dia 26 de abril anunciaremos a resposta que vamos dar a esta intransigência do Governo em termos salariais”.
Notícia atualizada às 14:24 com a posição da FESAP e às 16:26 com a posição da Frente Comum